Produto intemporal da imaginação é o deixar fluir através de nós como canal, a inspiração que não sabemos de onde vem. Os mais racionais explicá-la-ão à luz da ciência, e bem, mas o que é mais interessante é que essa explicação se cruza com a sensação catártica de uma experiência puramente emocional/instintiva.
Como seres humanos temos a tendência de precisar de nos definir com superioridade face aos restantes animais. Consideramo-nos superiores, porque temos (ou achamos que temos) uma singularidade a mais do que as restantes raças e espécies – o ser racional.
Ser racional permite uma capacidade analítica de compreender o mundo que nos rodeia e transforma-se automaticamente num prazer quando o nosso entendimento compreende como é que algo se processa, deixando-nos mergulhados num êxtase intelectual.
O aborrecido é quando isso não acontece. Aí, analisamos e perscrutamos a mais ínfima parte do nosso ser e temos (“porque não podemos falhar”) que descobrir as causas do erro (ou daquilo que classificámos como tal). Procuramos tantas e tantas vezes a causa do suposto erro que na maioria das vezes acabamos por descobrir mais do que um, e a causa nem vê-la, tornando-se assim uma verdadeira causa perdida, que gera subsequentemente um desgaste mental.
Por outro lado quando encontramos a causa da falha, demoramo-nos nela e decompô-mo-la de variados pontos de vista, na tentativa quase desesperada de ela desaparecer. Mas se pararmos para pensar, alguma coisa, alguma vez desapareceu por a cortarmos em pedaços sucessivamente mais pequenos? Pois. Claro que não.
O cérebro analítico não basta e é por isso que se torna necessário lembrar-nos de que somos para além disso animais e por consequência temos instinto e com o instinto vem a emoção.
Todavia, dado que a atual necessidade mundana é o desenvolvimento, a correria no sentido dos ponteiros do relógio castra a emoção. Ao não possuir espaço para se desenvolver, porque naturalmente ela existe e vem por definição connosco de berço, ela morre sufocada pelo raciocínio analítico que alimenta os egos e as carteiras.
Atente-se agora por momentos no lado emocional per si. Bastar-nos-á deixarmos que o corpo tome as suas decisões baseadas nos estímulos exteriores? Bastar-nos-á entregar-nos àquilo que o nosso interior defende que é o melhor para nós? Todas estas perguntas nos assaltam quando a emoção é a forma de viver a vida. Viver com base na emoção é ser-se hoje, é ser-se minuto, e por vezes as exigências da vida não permitem que assim seja. A necessidade de ter amanhã subjoga por completo a emoção do ser-se hoje.
Vivemos entre dois conceitos que não nos permitem uma vivência plena enquanto os considerarmos diametralmente opostos. A luta que muitos de nós travam hoje em dia é consequência disso mesmo e única solução é a integração verdadeira e consciente de ambas as vertentes quer da razão, quer da emoção.
Uma vez mais se pararmos para pensar, reparamos que a praticamente ninguém admite estar preocupado com a questão do balanço das quantidades de emoção e razão no seu dia-a-dia, ainda que este não deixe de ser um dos dilemas existenciais do Homem.
É interessante notar também que caminhamos às “apalpadelas” na vida, sobretudo porque não há um manual que nos ensine a viver e porque se pensamos demasiado nela não vivemos e se a vivemos demasiado somos uns libertinos. É realmente difícil o meio termo.
Caminhamos tal e qual a Natureza, com a diferença de que começámos em pólos opostos. Ela, nasceu e conformou-se numa plenitude existencial que a ganância do Homem veio perturbar. Ao queremos mais para nós, fize-mo-la perder a sua estrutura racional e agora estamos a sentir na pele, através dos seus furacões, derrocadas, e outras catástrofes naturais, a emoção enraivecida que agora nada nem ninguém contém. Por outro lado, nós começámos no berço sob a forma de emoção/instinto, respondendo aos estímulos exteriores do ambiente de forma quase desenfreada e à medida que fomos crescemos fomos sendo “racionalizados” (contidos) pelo nosso semelhenate a fim de começarmos a “ganhar forma”, para podermos “vir a ser alguém” na sociedade em que vivemos.
Nem nós, nem a natureza estamos em equilíbrio. Mas será verdadeiramente possível e preciso um equilíbrio? No mundo ideal e teórico, sim, como se comprovam pelas várias leis termodinâmicas que regem os sistemas tais como os conhecemos. E no mundo real? Será que o equilíbrio de forças não levará a uma resultante nula? Para o mundo se mover, para algo acontecer é sempre preciso uma pressão/motivação ou crença. Sem elas a desequilibrarem a balança não temos velocidade, não existe uma aceleração, e consequentemente não nos movemos.
Será esse o fim? Será o fim determinado pelo equilíbrio de forças, que geram uma resultante nula? Então, se assim for, talvez o segredo resida no aceitar da dualidade necessária de emoção e de razão, nas quantidades que nos permitam continuar a mover e a levar a nossa vida em frente, tendo consciência de que as podemos alterar deliberadamente em nosso favor.
Ser Humano é ser analítico o suficiente para perceber que a compreensão do mundo que nos rodeia é apreendida e valorizada através da emoção, e também que sem ambas as visões (racional e emocional) ele não faria sentido.