Relatividade, gravidade, mecânica quântica, eletrodinâmica e evolução. Assim se poderiam resumir os grandes temas científicos tocados pelo filme Interstellar de Cristopher Nolan.
Para além disso a teia adensa-se, quando a par com estes grandes conceitos científicos há um dissertar constante e transversal, sobre questões de sobrevivência, amor, futuro, paternidade e coragem.
Quando o filme começa a humanidade encontra-se num ponto da História em que é tarde demais para reparar os danos que o planeta terra sofreu. Os nossos excessos resultaram na consequência maior que toda a humanidade teme em silêncio – não haver condições de subsistência para todos. Urge encontrar novo lugar para viver. Nesse momento envergonhamos os nossos filhos, sem eles sequer ainda terem nascido, tornamo-nos os vilões da História ao termos gasto os recursos de forma desenfreada.
No momento de constatação de que já não há nada a fazer senão deixar o planeta, Nolan aponta-nos o dedo, como se perguntasse se será mesmo preciso chegar a esse ponto, para fazer alguma coisa por aquele que é a nossa casa – o planeta Terra. É neste contexto que encontramos Cooper (Matthew McConaughey), um ex-piloto totalmente frustrado por possuir uma vida tão estéril quanto o ambiente que o rodeia. A sua curiosidade acaba por levá-lo às instalações secretas da NASA onde o obrigam a uma das decisões mais difíceis da sua vida: salvar a humanidade ou a sua família. Esta questão constrói-se transversalmente ao longo do filme, criando camadas de difícil definição, adensando a trama que se complica à medida que o filme vai avançando.
A escolha de Cooper é inesperada mas não menos racional. Eventualmente chega à conclusão que ao salvar o ser humano, salvará também os seus filhos, pelo que decide aceitar a proposta do Professor Brand (Michael Caine), de averiguar a existência de condições propícias para a vida em três diferentes planetas.
O que pensar sobre esta opção de Cooper? A sua decisão terá sido justa/correta/acertada? É impossível dar apenas uma resposta e ainda por cima considera-la dogmaticamente correta.
É facilmente percetível que a componente humana está muito presente em toda esta história, mas não será demasiado leviano esperar que alguém abandone a sua família em prol de toda a humanidade? Cruzam-se neste momento não só o desejo altruísta de salvar a espécie, como também o forte instinto de sobrevivência, sendo que em termos emocionais, torna-se difícil concordar com a escolha de Cooper. Não deixamos de gostar dele, simplesmente tentamos perceber o que faríamos na sua situação.
É após a decisão de Cooper que descobrimos a primeira consequência desta da escolha do herói. A dimensão da emoção é desta feita explorada ao máximo, nunca esquecendo de a abraçar à teoria da relatividade que nos faz sentir na pele a dor da ausência de anos, que para uns passam muito mais rapidamente do que para outros.
Uma vez mais Nolan consegue sublimar o enredo em termos de teia científica e faz-nos sentir que este não é um filme de ficção científica convencional. Ao entrecruzar os lados emocional e racional das personagens, consegue fazer-nos ver que talvez não sejam só as leis científicas a dominar o mundo, a lei da emoção também tem um papel preponderante na mutação do futuro.
À parte de ser um grande filme de ficção científica onde a ciência conseguiu ser representada com um elevado grau de fiabilidade, Interstellar é também um filme de aprendizagem sobre a vida. Ele faz-nos questionar o nosso desejo de trabalhar em comum em prol da espécie, mostrando ainda o desespero consequente do sacrífico de apenas uma pessoa para salvar toda uma Humanidade. Seríamos nós capazes de tal ato de altruísmo?
Porque é que não conseguimos ver aquilo que tão facilmente nos entra pelos olhos todos os dias nas notícias quando declaram novas tempestades, novas alterações climáticas, novos desastres ambientais? Até quando vamos continuar a disfarçarmo-nos de ingénuos e achar que “a culpa foi do vizinho do lado porque ele é que tem 2 carros e eu até ando de transportes públicos”?
Interstellar coloca o mundo emocional e o mundo racional em perspetiva. Ao deixarmo-nos envolver a fundo permite-nos relembrar a importância de aproveitarmos e vivermos este “recurso” único colocado ao nosso dispor – a vida.
Alertando-nos para a relatividade do tempo, faz-nos ainda perceber aquilo que muitas vezes na correria do dia-a-dia não percebemos – o tempo é uma preciosidade que ignoramos mais vezes do que o ideal, quando o gastamos inutilmente.
Por fim e considerando o tempo com um dos nossos bens mais preciosos, este filme permite-nos ficar a pensar sobre qual é a verdadeira razão que nos move para fazermos o que precisamos de fazer. A resposta é objetiva apesar de ser um sentimento subjetivo – a razão é o amor. Afinal de contas, fazemos o que fazemos, por causa dessa força invisível. Essa força que é tão ou mais poderosa que a gravidade. Sim, uma força ao estilo científico, com intensidade (o amor pela humanidade), direção (em todas elas), sentido (amor entre pais e filhos) e ponto de aplicação (os corpos humanos).
Em resumo, independentemente de todas as dimensões presentes durante o decorrer do filme, o amor aparece como força que estabelece relações intemporais, e que é energia da nossa vontade de querer e ser. Ele é o verdadeiro destaque deste filme, que poder ser caracterizado como um filme de verdade emocionalmente científica, pois demonstra-nos de forma quase matemática, que nesta vida apenas uma coisa importa: fazer as coisas com e por amor.